De acordo com informações do site do Ministério da
Saúde, o novo agente do coronavírus foi descoberto em
31/12/19 após casos registrados na China e é responsável
pela doença chamada de coronavírus (COVID-19). Com a
declaração de pandemia pela Organização Mundial de
Saúde (OMS), surgem diversas questões atinentes às
medidas de contenção e tratamento da doença, que
trazem consequências para as relações de trabalho.
Nesta cartilha, serão abordadas algumas medidas que
poderão ser adotadas pelos empregadores na contenção
da doença.
ADOÇÃO DE QUARENTENA E ISOLAMENTO PELO PODER PÚBLICO
Com o avanço da doença e diante de medidas já adotadas por
outros países, surge a dúvida sobre as consequências para as
relações de trabalho da determinação de quarentena ou
isolamento pelos gestores de saúde.
No dia 06/02/2020, foi promulgada a Lei nº 13.979/2020, que
dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência
de saúde pública de importância internacional decorrente do
coronavírus responsável pelo surto de 2019.
De acordo com a legislação e desde que autorizado ou
determinado pelo Ministério da Saúde, é possível a adoção de
medidas de isolamento e quarentena pelos gestores de saúde:
Art. 3º da Lei nº 13.979/2019:
Para enfrentamento da emergência de saúde pública de
importância internacional decorrente do coronavírus, poderão
ser adotadas, entre outras, as seguintes medidas:
I – isolamento; II – quarentena;
De acordo com o art. 3º, § 3º dessa lei, a ausência do
empregado no trabalho em razão da quarentena será
considerada falta justificada ao trabalho.
Nesse caso, o empregado receberá a remuneração
normalmente e seu contrato será interrompido até o
reestabelecimento das condições de trabalho.
FÉRIAS COLETIVAS
E FÉRIAS SIMPLES:
Como medida para evitar a contaminação, as empresas podem
conceder férias individuais ou coletivas aos trabalhadores.
As férias coletivas podem ser determinadas a todos os
empregados ou a trabalhadores de determinados
estabelecimentos ou setores da empresa nos termos do art. 139
da CLT. Nesse caso, o § 2º do art. 139 exige a comunicação prévia
de 15 dias ao Ministério da Economia e ao sindicato da categoria
profissional.
Diante da configuração de força maior, o prazo poderá ser
dispensado como medida de higiene, saúde e segurança do
trabalho.
Além disso, é possível, ainda, a concessão de férias individuais
aos empregados que tenham completada período aquisitivo.
Nesse caso, a legislação exige a comunicação prévia ao
empregado com antecedência de, pelo menos, 30 dias.
Entendo que, em razão de força maior para conter a pandemia,
a comunicação prévia pode ser dispensada. É importante
destacar que as férias são concedidas a critério da empresa
sempre de acordo com seus interesses.
OUTRAS OPÇÕES DE AFASTAMENTO,
CASO O EMPREGADO NÃO TENHA
COMPLETADO O PERÍODO AQUISITIVO:
Compensação de jornada e banco de horas:
Por acordo individual com os trabalhadores ou mediante
negociação coletiva, as empresas podem firmar compensação
de jornada e banco de horas nos termos do art. 59 da CLT para
que os empregados possam compensar eventuais horas
extras realizadas antes da pandemia, com descansos durante
o período de quarentena.
Nessa hipótese, o trabalhador descansará as horas extras já
realizadas, salientando, contudo, que tal compensação não
poderá exceder o período máximo de seis meses, caso tratada
diretamente com o funcionário e não poderá ultrapassar a
soma das jornadas semanais de trabalho, nem 10 horas diárias.
MARCAÇÃO DE PONTO
ATRAVÉS DE BIOMETRIA
Diante da pandemia de coronavírus e uma vez que tal doença
é extremamente contagiosa, sugerimos a suspensão do uso
da marcação biométrica pelas empresas e a adoção de outros
meios de controle de jornada, a exemplo das fichas e
papeletas.
REGIME DE TRABALHO
EM CASO DE FORÇA MAIOR
Sempre que ocorrer interrupção do trabalho, resultante de
força maior (no caso em questão a pandemia de coronavírus
enquadra-se em tal definição) que determine a
impossibilidade de sua realização, a duração do trabalho
poderá ser prorrogada pelo tempo necessário, sendo a
prestação de horas extras de, no máximo, 2 horas diárias,
durante os dias indispensáveis à recuperação do tempo
perdido.
Durante esse período, é devido valor da hora normal acrescido
de adicional de 50%, não se confundindo com compensação
de jornada. Esse período não poderá ser superior a 45 dias por
ano. Não há necessidade de prévio acordo ou convenção
coletiva.
De acordo com o art. 61, § 3º, da CLT, há necessidade de prévia
autorização do Ministério da Economia.
TRABALHO EM “HOMEOFFICE”
E TELETRABALHO
A primeira dúvida das empresas e dos trabalhadores é a
possibilidade de trabalho em domicílio.
A empresa pode determinaro trabalho realizado na
modalidade “homeoffice” em virtude da pandemia.
Importante salientar que o trabalhador em “homeoffice”
mantém todos os direitos trabalhistas, inclusive no tocante à
limitação da jornada de trabalho, intervalos, períodos de
descanso e trabalho noturno.
Outro questionamento diz respeito à possibilidade de
implementação do teletrabalho, que corresponde ao regime
de contratação regulamentado pela Reforma Trabalhista nos
art. 75-A a 75-E da CLT.
No teletrabalho, o empregado deixa de se submeter às regras
atinentes à limitação da jornada de trabalho, não tendo direito
a horas extras, intervalos e demais períodos de descaso. De
acordo com o art. 75-C, § 1º da CLT, a alteração do regime
presencial para teletrabalho exige o acordo bilateral entre
empregado eempregador.
Além disso, a legislação que a transição entre o trabalho
presencial e telemático seja formalizado através de aditivo ao
contrato de trabalho, que deverá prever, ainda, as questões
atinentes a aquisição, manutenção ou fornecimento dos
equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária
para a prestação do serviço remoto, bem como o reembolso
de despesas arcadas pelo empregado.
PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE
DE TRABALHO E AFASTAMENTO
DO TRABALHADOR COM COVID19
É dever das empresas manter o meio ambiente de trabalho sadio. Dessa
forma, os empregadores devem orientar os empregados em boas
práticas de higiene e saúde diante do coronavírus para evitar a
disseminação da doença. Nesse sentido, devem ser transmitidas aos
empregados ordens, conforme orientações da OMS, para lavar as mãos
com água e sabão ou passar álcool gel, evitando o contato com as
mucosas, cobrir boca e nariz ao espirrar ou tossir, dentre outras.
A empresa, que constatar que alguns de seus empregados estão
contaminados pelo coronavírus (COVID-19), devem requerer
administrativamente a concessão do benefício por incapacidade
temporária (auxílio-doença), com a disponibilização do atestado
médico particular comprobatório da contaminação. Não será
necessária a realização de perícia médica a cargo do INSS. A empresa
deverá arcar com o pagamento do salário de seus empregados nos 15
primeiros dias de afastamento. A partir do 16 dias, o empregado
receberá o benefício previdenciário do INSS.
A INFECÇÃO POR CORONAVÍRUS
DURANTE A PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS
CONFIGURA ACIDENTE DE TRABALHO?
A infecção por profissionais da saúde configura acidente de trabalho
equiparado na condição de para sua eclosão ou agravamento doenças
ocupacionais nos termos do art. 20 da Lei nº 8.213/1991. No entanto, em outras áreas, se a eventual infecção não decorrer diretamente da
atividade desenvolvida ou o trabalho não contribua diretamente para
sua eclosão ou agravamento, não haverá configuração de acidente de
trabalho atípico e consequente direito a estabilidade.
REDUÇÃO DE JORNADA E SALÁRIO
POR INSTRUMENTO COLETIVO
E POR ACORDO INDIVIDUAL
De acordo com o art. 7º da Constituição Federal, a redução da jornada de trabalho e dos salários depende de prévia negociação coletiva com o sindicato. Além disso, o art. 611-A, § 3º da CLT estabelece que, se houver previsão em acordo ou convenção coletiva de redução de salário, deve ser assegurada estabilidade no empregado até o fim da vigência desse instrumento coletivo.
Já o artigo 503 da CLT estabelece que “é lícita, em caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados, a redução geral dos salários dos empregados da empresa, proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a 25%, respeitado, em qualquer caso, o salário mínimo da região”.
A pandemia da COVID-19 caracteriza, sem dúvidas, uma situação de força maior, assim entendida como “todo acontecimento inevitável em relação à vontade do empregador e para cuja realização não tenha concorrido, direta ou indiretamente” (artigo 502 da CLT). Logo, em princípio, perfeitamente aplicável o artigo acima, que permite a redução salarial.
Contudo, há normas constitucionais que vedam a redução salarial (art. 7º, inciso VI, da CRFB/88), colidindo diretamente com a aplicação do artigo supramencionado. Portanto, o artigo 503 é incompatível com a Constituição de 1988 e por ela não foi recepcionado, razão pela qual a redução salarial só poderá ocorrer mediante ajuste com a entidade sindical, sob pena de ilicitude e alto risco de condenação judicial posterior.
Assim, para que torne-se viável a redução proposta pelo art. 503 é mister a
negociação de contrapartida em benefício do empregado, sob pena da
redução caracterizar renúncia de direito indisponível do trabalhador.
Por fim, importante dizer que se for pactuada cláusula que reduza o
salário ou a jornada, a convenção coletiva ou o acordo coletivo de trabalho deverão prever a proteção dos empregados contra dispensa imotivada durante o prazo de vigência do instrumento coletivo, conforme prevê o artigo 611-A, § 3º, da CLT.
CONCLUSÃO
Neste momento, empregadores e empregados devem se
pautar pela razoabilidade nas ações adotadas diante do
enfrentamento do coronavírus, de modo a proporcionar as
melhores soluções que tragam menos impactos à
economia, resguardem a saúde da população e que estejam
nos limites das normas trabalhistas vigentes. Apesar de se
tratar de um momento de excepcionalidade nunca vivido
em tempos recentes, justificando portanto a adoção de
medidas excepcionais, as decisões a serem tomadas por
empregadores e empregados deve estar amparadas em
opinião técnica de advogados capacitados.